Imagem meramente ilustrativa de Lillith |
Destacam-se as características de Eva e de Lilith, a fim de aproximá-las como mito da primeira mulher. Eva, do hebraico, “vivente” ou “a que dá vida”, é a primeira mulher, esposa de Adão e mãe dos viventes. Eva “foi feita (literalmente formada) por Deus a partir de uma das costelas de Adão” (PFEIFFER et alii, 2007, p. 711).
Sua criação está ligada à criação do homem. No texto bíblico hebraico-cristão, está descrita a criação do homem e da mulher à imagem e à semelhança de Deus, após a criação da terra, plantas e animais, no capítulo primeiro. Essa é considerada a verdadeira criação, ex nihilo, do nada, por meio da fala. Assim, “… Deus disse: ‘Façamos o homem à nossa imagem e semelhança.’ [...] E Deus criou o homem à sua imagem; à imagem de Deus ele o criou; e os criou homem e mulher.” (Gen 1:26-27). Interessante é constatar, pelo trecho bíblico, que antes de haver um relato pormenorizado sobre a formação do homem Adão e a da mulher Eva, já existe uma referência sobre a criação divina da humanidade: criou-os, o ser homem e o ser mulher. Depois, entregou toda sua criação aos dois, para que a dominassem, dela se alimentassem e povoassem a terra com seus descendentes.
No segundo capítulo, Deus plantou um jardim em Éden no Oriente, onde colocou o homem, impondo-lhe a condição única para sua existência: não comer da árvore do conhecimento do bem e do mal. Deste modo, para que o homem vivesse em harmonia e em paz, deveria se subordinar a Deus e obedecer a esta condição. Em seguida, Deus disse: “Não é bom que o homem esteja sozinho. Vou fazer para ele uma auxiliar que lhe seja semelhante.” (Gen 2:18).
“Então Javé Deus fez cair um torpor sobre o homem, e ele dormiu. Tomou então uma costela do homem e no lugar fez crescer carne. Depois, da costela que tinha tirado do homem, modelou uma mulher e mostrou-a para o homem.” (Gen 2:21-22). Deus cria a mulher a partir da costela, criada do lado, para ser sua companheira. Quando o homem a viu, exclamou: “Essa sim é osso dos meus ossos e carne da minha carne! Ela será chamada mulher, porque foi tirada do homem!” (Gen 2:23).
No terceiro capítulo de Gênesis, está descrita a origem do mal. Eva não poderia comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, pois poderia morrer. Entretanto, a serpente lhe diz que eles não morreriam por isso, “Mas Deus sabe que, no dia em que vocês comerem o fruto, os olhos de vocês vão se abrir, e vocês se tornarão como deuses, conhecedores do bem e do mal.” (Gen 3:5). Comer daquele fruto era ter a pretensão de ser Deus, autossuficiente. “Quando o homem se torna auto-suficiente, se rebela contra o projeto de Deus e faz o seu próprio projeto: liberdade e vida só para si mesmo.” (BALANCIN; STORNIOLO, 1997, p. 16), isto é, ter conhecimento do bem e do mal pode gerar a degradação do homem, como se verifica nos trechos seguintes.
A mulher, então, pecou e depois deu o fruto ao marido. A tentação da serpente se configura no pecado cometido pela mulher e, em seguida, pelo homem, guiado pela mulher. A primeira consequência desse ato foi homem e mulher perceberem que estavam nus e se esconderam de Deus, porque tiveram medo. Quando Deus os encontra, o homem diz ter recebido o fruto da mulher, e esta dissera tê-lo recebido da serpente. (Gen 3:11-13). Pelo pecado cometido, todos foram punidos.
Primeiramente, Deus pune a serpente, dizendo: “Por ter feito isso, você é maldita entre todos os animais domésticos e entre todas as feras. Você se arrastará sobre o ventre e comerá pó todos os dias de sua vida.”. Ela seria, também, inimiga da mulher e de seus filhos, ferindo-lhes o calcanhar. (Gen 3:14-15). A mulher, por sua vez, recebeu seu castigo também conforme as palavras de Deus: “Vou fazê-la sofrer muito em sua gravidez: entre dores, você dará à luz seus filhos; a paixão vai arrastar você para o marido, e ele a dominará”. (Gen 3:16). O ato de comer o fruto, a vontade de adquirir conhecimento do bem e do mal, explica como a dor do parto e a submissão feminina ao homem passaram a existir.
Então, o homem é punido por dar ouvidos à mulher e Deus disse: “maldita seja a terra por sua causa. Enquanto você viver, você dela se alimentará com fadiga. A terra produzirá para você espinhos e ervas daninhas, e você comerá a erva dos campos.”. O homem passa a ter de plantar o que come, por isso, terá de comer com o suor do rosto. (Gen 3: 17-19). O homem gerou a necessidade do trabalho, lavrando a terra para a qual retornará, voltando para a natureza da qual fora criado.
Simbolicamente, Eva representa, antes do pecado e junto com Adão, a incorruptibilidade; após o pecado, ela é a tentação dele. A serpente distingue-se de todos os animais terrestres, é uma criatura fria, sem patas, sem pelos, sem plumas, brinca com os sexos; é fêmea e macho, possui arquétipos ligados à noite fria e à sombra. Representa também a fecundidade, mestre das mulheres e é condenada pela cristandade. Analogamente, há dualidade em seus aspectos, pois seu veneno tanto mata quanto cura, quando nas doses certas; resume regeneração, imortalidade e é símbolo da medicina; representa a sabedoria na mitologia grega, sempre ao lado de Atena, deusa da sabedoria.
A serpente é guardiã do conhecimento do bem e do mal. Assim, “os mitos da busca da imortalidade ou da juventude ostentam uma árvore de frutos de ouro ou de folhagem miraculosa, que se encontra ‘num país longínquo’ (na realidade, no outro mundo) e que é guardada por monstros (grifos, dragões, serpentes)” (ELIADE, 2001, pp. 124-25). Deve-se lutar contra os monstros, submeter-se a uma prova iniciática para obter a condição divina, invencibilidade. Eva passa por essa prova, desobedecendo a Deus, para possuir o conhecimento. A serpente é considerada a manifestação do demônio que tenta Eva a cometer o pecado e, portanto, uma afronta a Deus.
O demônio feminino, geralmente, é manifestado por meio do espírito de Lilith de acordo com algumas culturas, como a suméria, árabe e outras. Conforme a tradição judaica, Lilith não se entendia com Adão, sobretudo porque não queria estar por baixo dele durante o enlace conjugal. Ela estava insatisfeita, desejava liberdade, mudança e fuga, pois foge para o Mar Vermelho. Nas mitologias a seu respeito, ela é repleta de imagens de desolação, diminuição, vingança e raiva.
Lilith é conhecida como um demônio noturno de cabelos longos, uma força, um poder, uma renegada e um espírito. Tem aspecto humano, mas possui asas e “sobrevoa as mitologias suméria, babilônia, assíria, canoneia (ou cananeia ), persa, hebraica, árabe e teutônica” (KOLTUV, 1997, pp. 9-13). É também popular por agarrar os homens e mulheres que dormem sozinhos e provocar-lhes orgasmos noturnos e sonhos eróticos.
Na tradição histórico-religiosa, seu aspecto era de terrível deusa-mãe. Além disso, quando encarada por um homem, seu aspecto é de “prostituta divina ou, psicologicamente falando, aquele da anima sedutora, fica mais em evidência” (HURWITZ, 2006, p. 33). Quando encarada por uma mulher, tem aspectos da terrível mãe, prejudica mulheres grávidas e rouba as crianças recém-nascidas. Sempre propensa a matá-las, bebe seu sangue e suga os ossos, por isso é chamada “a estranguladora”.
Na Bíblia Cristã, ela somente aparece no livro de Isaías (34:14-15). O texto “é uma crítica veemente às grandes potências, anunciando a falência delas. Soa como grande intimidação frente ao orgulho e à injustiça com que os poderosos desfiguram a integridade da vida humana” (BALANCIN; STORNIOLO, 1991, p. 977). Então, o texto critica a opressão e, nesse sentido, menciona imagens fortes dos oprimidos. Nesse capítulo, segundo a visão do profeta Isaías, Deus condena os opressores, convidando-os para ouvir e, descreve a destruição das gerações que serão abandonadas, “Seus herdeiros são o pelicano, o ouriço; a coruja e o urubu fazem aí sua morada. Javé estenderá aí o prumo do caos e o nível da confusão.” (ISAÍAS 34:11).
Aí vão se encontrar o gato do mato e a hiena, o cabrito selvagem chamará seus companheiros; aí Lilith vai descansar, encontrando um lugar de repouso. Aí vai se aninhar a cobra, que botará, chocará os seus ovos e recolherá sua ninhada em sua sombra; aí se reunirão as aves de rapina, cada qual com sua companheira. (Is 34:14-15).
Analisando o trecho, Lilith encontra-se entre animais de carga negativa, como urubu e coruja, hiena, animais da noite, que comem carne em decomposição, ratos e etc., são impuros e causam repulsa. Ela foi amaldiçoada por Deus a viver assim, banida. Lilith apresenta um aspecto dual, grande mãe terrível e anima sedutora. Nessa tradição, pode-se dizer que o feminino sempre foi visto como ameaçador, foi desvalorizado e demonizado. Já “a literatura interessa-se, sobretudo por Lilith, a revoltada, que na afirmação do seu direito à liberdade e ao prazer, à igualdade em relação ao homem, perde a si própria, assim como perde aqueles que a encontram” (BRUNEL, 1997, p. 583). Assim, Lilith é citada pela carga negativa que representa.
Pode-se, neste momento, trazer à tona um texto literário em que Lilith aparece. Em Fausto de Goethe, após cerrar o pacto com Mefisto, Fausto sai da realidade e participa de uma festa com bruxas, demônios e fantasmas, a “Noite de Valpúrgis”, quando ele dança com Lilith. Antes, pergunta quem é ela e Mefisto lhe diz que é a esposa número um de Adão. “Cautela com a formosa trança, / Que, unicamente, a adorna até a ilharga.” (GOETHE, 2004, p. 461). Lilith é descrita com cabelos longos, nua, com poder de seduzir os homens, características consoantes ao que se sabe dela.
Portanto, a figura de Lilith é ambígua, possui origens diversas e contraditórias, mas sempre se mantém seu aspecto negativo, destruidor e demoníaco. Ela está em constante mudança e se manifesta em todo e qualquer sentimento negativo tanto na mulher que se revolta, quanto no homem que liberta desejos ocultos. Sua figura tem sido omitida, mas a tradição da mitologia judaica, suméria e outras ainda preservam sua história. Mesmo que omitida da própria escritura sagrada, há vestígios que comprovam sua presença no texto de Isaías, mesmo com nomes diferentes nas diversas traduções.
Considerando Lilith como a serpente que faz com que Eva peque, pode-se, em uma linha dialógica, ilustrá-la com um afresco de Michelangelo, situado no teto da Capela Sistina, que mostra, em beleza celestial, o pecado original e a queda do Paraíso.
Nele, Adão e Eva estão sob a árvore do fruto proibido e, no tronco da árvore uma mulher, metade serpente, está enroscada. Eva aceita o fruto de sua mão. Ela é, conforme a Bíblia, a serpente que distorceu a palavra divina para convencer Eva. No entanto, retratada com tronco de mulher e com a parte inferior de serpente, pode ser considerada Lilith, pois, criada juntamente com Adão, possui forma humana, sob a ótica pictórica de Michelangelo, o que comprova esta análise interpretativa.
Analisar um pouco das coisas que ouvimos não é errado, devemos tomar cuidado com tudo que ouvimos e aceitamos, questionar não significa não ter fé.
Confira também:
Texto de Ester Zuzo de Jesus
Ester Zuzo de Jesus Possui Graduação em Letras pela Universidade Presbiteriana Mackenzie com habilitação em Português e Inglês (2009). Foi pesquisador do Centro de Comunicação e Letras da UPM pelo grupo de pesquisa LEMI: Letras, Epistemologia, Memória e Identidade sobre a História do Curso de Letras da UPM (2008).
FONTE: Excertos do artigo “O Possível Entrelaçar do Eterno Mito Feminino: Eva e Lilith em Pandora”. http://grupopapeando.wordpress.com
Lilith nunca existiu quem inventou essa história apenas quis colocar uma lacuna na cabeça das pessoas para dizer que adão teve duas mulheres...se adão tivesse duas mulheres uma delas seria sua prória filha já que o mesmo foi o primeiro homem criado por Deus e a bíblia não relata em nenhum momento que Adão tenha coabitado com sua própria filha.
ResponderEliminarPura balela.....
NINGUEM PODE AFIRMAR SE LILITH EXISTIU OU NÃO A BIBLIA TEM TANTOS MISTERIOS MAU CONTADOS TANTOS ENIGMAS PODE HAVER MUITAS COISAS QUE NÃO FORÃO ESCRITAS LÁ
ResponderEliminarSó existiu um casal criado diretamente por Deus(יהוה ).Os relatos de Gênesis capítulo 1 e Gênesis capítulo 2 pertencem a fontes Sumerianas diferentes. O capítulo 1 é mais genérico , já o capítulo 2 é mais detalhado. É por isso que no primeiro não é mencionada a costela. A Prova disso está no verbo יהוה .No capítulo 1 Ele não aparece, já no capítulo 2 ele aparece várias vezes. O verbo hebraico יהוה significa "tornar-se". Este verbo , quando vem acompanhado do termo elohim, designa A Majestade Suprema. Esta designação só ocorre a partir do capítulo 2 de Gênesis. O escritor Moisés utilizou diferentes fontes Sumerias para compor os relatos de Gênesis. Ele sem dúvida estava preparado para tal tarefa de tradução pois ele mesmo havia sido instruído em toda a sabedoria dos egípcios.
ResponderEliminarEstou cada vez mais confusa !!
ResponderEliminarExiste outras histórias também.
ResponderEliminarEva poderia ter sido a mãe de Adão e ele se apaixonou por ela. Houve incesto,por isso a questão homem e mulher é conflituosa. O jardim do
Éden era uma civilização e primeiramente existiu o matriarcado depois ocorreu o patriarcado. E a humanidade já foi hermafrodita e houve separação quando surgiu Adão e Eva.
eu acho que "Deus" errou, pois se lilith existiu ou não, sendo a serpente ou não. 'Deus" errou, primeiro porque ele pode ver passado, presente e FUTURO, ele podendo ver o FUTURO por que ele criaria um animal que faria os humanos pecarem, sabendo que isso ia acontecer. Acho que "Deus" fez por tentação aos homens, acho que "Deus" errou fazendo isso, acho que ele fez por mal. E voltando um pouco antes creio eu que lilith pode ter existido sim sendo ou não a primeira mulher, creio eu que ela seja a "serpente"/"cobra", pois antes a "serpente" ela não se rastejava, ela andava, porque depois que "Deus" amaldiçoou ela para ela se rastejar sobre seu ventre, nisso da se a entender que ela andava, ou seja, existiu mais alguém ou alguma coisa, e "Deus" a criou...
ResponderEliminarLILITH DIZEM APARECE EM ISAÍAS UMA VEZ SE FOSSE REAL TERIA SIDO RELATO MAIS CONSTANTE
ResponderEliminarLilith nunca existiu a primeira mulher foi Eva, já que ela foi a mãe de todos os viventes, se foi mãe é que os originou, se os originou não nasceu de nenhum ser vivente, se não nasceu foi criada por Deus, se esta tal de Lilith existisse poderia ser filha de Adão e não haveria necessidade de Deus criá-la, além disso em Isaías se o termo tiver sido usado na versão original em hebraico pode ter sido para quem lêsse o texto compriendesse que haveria várias situações ruins, além disso a religião hebraica ou cristã não tem preconceito ou machismo sobre o sexo feminino, Deus não bateu em Eva, a torturou nem nada disso, como fazem muitos ditos homens hoje quando a mulher os contraria outros povos, como os gregos, romanos e os povos da América tiveram sim preconceito contra a mulher inclusive os filósofos mais ditos como inteligentes como Aristóteles ele defendia que as mulheres deveriam se casar com 18 anos e ao homem aos 37, está lá no livro dele, a política, já na torah ou na bíblia cristã não há nenhuma citação do tipo! Na bíblia antigo testamento e no novo fala de sexo, assunto que era é ainda é em algumas sociedades tabú, o espírito cristão e judaico sempre foi libertador e avançado para a época, para aqueles que dizem que Deus do antigo testamento era sanguinário compare as leis de levítico, com o código de Hamurabi os dois são fáceis de encontrar na internet, todos que lerem os dois perceberam que o código de Hamurabi é bem mais sanguinário.
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